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Rodrigo Assis, o Horse |
Nesta semana temos o prazer de conhecer um pouco mais do trabalho de um Lightdesigner com um excelente profissional, Rodrigo Assis, começou sua carreira ao final da
década de 90, no Teatro da antiga Escola Técnica Federal de Goiás, assumindo a
função de técnico de luz e iluminador; logo depois, o dom de ter a luz nas
palmas das mãos levou-o para o teatro Zabriskie, Centro Cultural Martim Cererê,
Centro Cultural Goiânia Ouro, além do trabalho em diversos espetáculos,
festivais, mostras e eventos ligados ao cinema.
Graduando em Design de Interiores e Pós-graduando
em Docência do Ensino Superior, “Horse”, como também é conhecido, ainda domina
o “quadro-negro” e o giz. Palestras e oficinas já foram ministradas na
Faculdade Cambury, no Projeto Bastidores, Casa das Artes, Festival de Cinema
Perroloco, oficina de Iluminação Cênica aos alunos da Universidade Autónoma de
Querétaro, “Facultad de Bellas Artes”, no México.
Além
de light designer, Rodrigo Assis já atuou
e dançou, assumiu sonoplastia, cenografia, direção de palco, fotografia e
direção de curta-metragem, sendo premiado em diversas instâncias e
festivais
nacionais e internacionais. Vale a pena conhecer um pouco mais sobre
essa maravilhosa profissão. Confira!
Déborah de Sousa - DS: Rodrigo, para iniciarmos
esse papo, gostaríamos de saber como tudo começou. Como
você se interessou por light design?
RA: Tudo
começou na antiga Escola Técnica Federal de Goiás. Naquela época, tínhamos
atividades relacionadas a artes, como música, dança, artes plásticas e teatro,
que acabei me enveredando. O teatro surgiu como uma brincadeira que mais tarde
se tornou algo sério, mas quando eu começava o processo de criação de um
espetáculo, já me interessava também pelos bastidores: na luz, no cenário e no
som. Em 1998, surgiu a oportunidade de trabalhar como bolsista na instituição e
pela vontade de estar mais envolvido com a arte, pedi que me colocassem no
teatro e fui atendido. Trabalhando lá comecei a tomar gosto pela iluminação,
percebi que não “era um bom ator”, mas poderia estar em cena através da luz
para dar suporte e ter meu espaço na construção da dramaturgia da peça.
DS: Visto que você é um profissional bem
versátil e que atua em diversos meios, qual a diferença das técnicas de
iluminação para teatro e para cinema?
RA: Antes de
mais nada vamos separar o título de cada profissão. No teatro, chamamos de
iluminador; já no cinema, nomeamos como fotógrafo. Enquanto que o iluminador
usa as características de nossos olhos para iluminar, o fotógrafo utiliza as
características das lentes das câmeras para tal. Tanto no teatro quanto no
cinema temos a intenção de iluminar a cena para que ela seja vista pelo
telespectador ou a plateia com suas nuances e intenções, mas no cinema a lente
da câmera é muito mais sensível que o nosso olho, já quando vemos algo ao vivo
não percebemos alguns detalhes que a câmera consegue captar. No teatro
utilizamos muitos filtros de cor (gelatinas) com intenção de alterar a
propriedade da luz para se obter, por exemplo, uma luz noturna, brincamos com o
azul ou o alaranjado do pôr do sol e já no cinema, se utilizarmos essas mesmas
gelatinas, teremos cores estouradas, como alguns filmes que foram produzidos nas
décadas de 60 e 70, principalmente os filmes para realçar alguma cena de
horror, pesadelo, sonhos, desvanecidos. Não estou dizendo que os filmes não
devem produzir tais efeitos, mas que somente hoje em dia não se usa muito.
No cinema trabalhamos com algumas gelatinas corretivas com intenção de
corrigir a luz amarelada das lâmpadas halógenas ou incandescentes. Mas cada
iluminador ou light designer tem suas técnicas e suas intenções ao iluminar uma
cena, o que ele deve pensar é se aquele efeito ou cor vai casar com a intenção
que o diretor quer passar para o público, pois uma cor ou efeito pode danificar
todo um trabalho que tenha levado meses, e até anos, para ser desenvolvido.
DS: Visto que o Light Design (Design de luz)
está nos bastidores de uma produção e por isso muitas pessoas desconhecem o que
realmente faz esse profissional, nos conte um pouco mais sobre essa profissão e
as possíveis áreas de atuação.
RA: Antes de
se tornar um iluminador, acredito que é preciso passar por todo um processo de
aprendizagem. Começamos como curiosos, pois no Brasil não se tem uma escola ou
curso para criar este profissional, temos que correr atrás, buscar livros,
assistir aos espetáculos e filmes para começarmos como técnico de luz; em
seguida, como operador de luz, para só depois começarmos a criar a luz. Isso
porque para se criar algo devemos conhecer as ferramentas e o material que se
está trabalhando. Como iluminador, trabalhamos para criar um projeto de luz de
um espetáculo teatral, show, circo, dança e cinema. Começa-se com o processo de
leitura do texto, acompanhamento de ensaios e conversas com o diretor, cenógrafo,
figurinista, maquiador...Pois sua luz interfere diretamente em tudo que é
visual no teatro ou no cinema. Mas podemos trabalhar também como técnicos de
luz de uma montagem teatral ou eletricista em uma produção cinematográfica,
como operadores de luz, no caso do teatro, com o mapa de luz e o roteiro de luz
com todas as deixas e cenas passadas pelo iluminador podemos “operar” ou
controlar a luz sem a presença dele. Quando se pensa no profissional atuando
nas artes Cênicas ou no cinema, temos poucos técnicos e operadores de luz
capacitados, iluminadores então, nem se fala. O mercado em Goiânia nesta área está
crescendo, uma prova disso são os diversos espetáculos e festivais que nosso
estado produz, precisando cada vez mais de profissionais. Precisamos formar mais
pessoas capacitadas para tal e muitas vezes o que acontece é que os
interessados começam por curiosidade ou acompanhando alguém que já esta na
área, isso é um facilitador.
DS: Quais as maiores dificuldades encontradas
ao criar a luz para uma cena?
RA:
Para se
criar a luz de um espetáculo ou de uma cena devemos acompanhar a companhia artística
com suas leituras e ensaios para podermos colocar no papel nosso desejo de iluminação
para a cena. O fato é que quando vamos colocar o que pensamos em prática, temos
a dificuldade de tempo para montagem, pois só podemos ver a luz como realmente será
na prática, enquanto que o figurinista, maquiador e cenógrafo podem mostrar
antes como tudo ficará. O ideal é que para uma estreia precisaríamos entrar
pelo menos três dias antes no espaço a ser iluminado, pois tem o tempo de
montagem, ensaio, consertar ou adequar a luz ao espaço, gravar a cena, entre
outros fatores, e infelizmente só conseguimos isso na maioria das vezes no mesmo
dia da estreia, prejudicando assim nosso trabalho. Isso porque ou a produção do
mesmo não tem condições financeiras ou técnicas para conseguir o espaço antes,
ou os espaços não liberam para fazer todos os testes antes da estreia, isso é
mais comum em produções teatrais, shows, danças e circo.
DS: Quais os erros mais comuns de quem está
iniciando a carreira? Você acha que mesmo com toda a sua experiência, ainda
comete muitos erros?
RA: Antes de
mais nada, somos aprendizes. Para quem está começando não precisa ter vergonha
e tenha a humildade de perguntar sobre tudo que está acontecendo e o que vai
trabalhar. Muitas vezes os novatos querem mostrar o trabalho sem conhecer muito
do equipamento ou da situação onde se encontra e aí pode danificar o material e
até se machucar. Trabalhamos com materiais muitos sensíveis e caros, acho que o
erro mais comum de quem está entrando nesta área é a de queimar equipamentos,
como a lâmpada PAR 64, um refletor muito utilizado no teatro e show. Na sua
maioria ele é produzido na voltagem 110 v, mas como em Goiânia e no Brasil
trabalhamos com voltagem 220v, este equipamento queima com o discutido ou falta
de conhecimento do mesmo, por ele ser na voltagem 110 v; temos sempre que
ligá-lo em série, construindo um circuito elétrico fechado. Sendo eternos
aprendizes, podemos estar sempre suscetíveis aos erros, mas o mais importante é
aprender com eles para que não se repitam.
DS: Como técnico de luz, quais os riscos
existentes na atuação do profissional? Como evitá-los?
RA: Nessa
profissão estamos suscetíveis a vários acidentes de trabalho, trabalhamos nas
alturas, com eletricidade, equipamento pesados. Quando o público aprecia uma
obra teatral ou cinematográfica, ele muitas vezes não sabe das dificuldades e
perigos que essa profissão oferece. Para se evitar, sempre utilizam-se luvas,
pois como trabalhamos em sua maioria com lâmpadas incandescentes, elas chegam a
temperaturas elevadas que podem causar queimaduras graves; outra dica é
trabalhar de calças compridas e largas para que haja mobilidade no trabalho,
cintos de seguranças para trabalhar em alturas, lanternas, pois trabalhamos em
locais escuros, especialmente quando vamos afinar a luz (colocar os refletores
em suas posições); precisamos do BO (blackout) para que essa luz de serviço não
interfira no nosso trabalho; sempre estar calçado, nestes locais de trabalho se
têm muitos objetos jogados no chão, pedaços de cenário, acessórios de refletores,
para os cabeludos de plantão, é bom deixá-los sempre amarrados. Antes de mais
nada, precisamos nos preocupar com nossa segurança para só depois começar a
desenvolver o trabalho.
DS: Há algum trabalho que lhe deixou muito
inspirado? Algo marcante? Qual?
RA: De uma certa
forma todos os trabalhos são marcantes, pois são únicos. Quando se vai
trabalhar em um novo projeto, ele possui elementos, estéticas e conceituais
diferentes, possibilitando assim novas criações. Se fosse citar algum trabalho,
citaria a iluminação do espetáculo “Balanço”, monólogo com o ator Bruno Peixoto,
texto de Danilo Alencar e direção de Edson de Oliveira. É um espetáculo com
formato para palco arena em que o público assiste muito próximo ao ator. Neste espetáculo
trabalhei principalmente com o branco e suas nuances, foram usadas somente duas
cores distintas em momentos muito específicos. Todo o processo de criação foi prazeroso,
a história sensível sobre um homossexual com sua vida conturbada de amores,
desejos, repressões, preconceito. É um espetáculo muito marcado com deixas de
som e marcações do ator, em que foi preciso muito sincronia para que tudo desse
certo. No final ficou um resultado muito bonito visualmente, combinando os
elementos da luz, cenário, figurino, maquiagem que conseguiu emocionar quem
assistiu ao mesmo.
DS: Como é o mercado do Light Design em Goiás?
O que pode ser feito para valorizar esse profissional?
RA: Aqui em
Goiás tem poucos profissionais na área, ainda mais em artes cênicas. Como não
se tem uma escola ou faculdade para se estudar a arte de iluminar, aprendemos
nosso ofício através dos anos trabalhando como técnico de luz, para só depois
de uma certa experiência podermos assumir um projeto de iluminação. Mas como em
toda profissão existem seus problemas, no nosso caso acontece de alguns
profissionais trabalhando como técnicos que, sem muita experiência, começam a
desenvolver projetos de luz cobrando valores muito abaixo do mercado, mas isso
não acontece somente com os iluminadores, mas com os técnicos de luz e
operadores, algo que deveria ser bem distinto, pois são três áreas de trabalho
parecidas. Mas cada um deve exercer sua profissão sem atravessar no trabalho
alheio.
DS: Como funciona o cachê/pagamento dos
profissionais de iluminação?
RA: A questão de
valor vai muito de cada profissional, mas normalmente se faz um orçamento para três
etapas distintas, criação, execução e operação. Sendo que a criação é o
processo mais longo de qualquer projeto, que envolve o estudo junto ao espetáculo
com acompanhamento de ensaios, discussão com o diretor, conversando com todos
os envolvidos visualmente como o figurinista, maquiador, cenógrafo. Não vou
colocar aqui valores por ser algo muito pessoal e depende muito do trabalho a
ser desenvolvido; vários fatores, como tempo de criação, tempo de montagem,
local, temporada, tudo é avaliado para se cobrar um valor justo tanto para o
iluminador quanto para a companhia ou grupo que no qual estamos trabalhando.
DS: Rodrigo, vimos que você está se especializando
em Docência do Ensino Superior, os planos são realmente seguir a carreira
acadêmica? Quais os meios acadêmicos de se profissionalizar em iluminação,
light design ou técnico de luz?
RA: Sim, estou
fazendo meus estudos com intuito acadêmico. São dois os fatores determinantes:
o primeiro é o aprendizado que nos torna mais qualificados para projetos futuros
e o segundo é que na área acadêmica se vê poucos professores ou estudiosos da
iluminação. De uma certa forma, se quiser seguir academicamente nessa área, tem
que procurar cursos nas faculdades onde sua pesquisa se encaixa, pois é difícil
haver mestrado e doutorado em iluminação aqui no Brasil. O mais fácil é
encaixar como campo de pesquisa dentro das artes cênicas, o que acontece é de
profissionais procurando se especializar, buscando seus estudos fora do país,
algo que por enquanto desejo fazer aqui mesmo no Brasil. Aqui em Goiás também
não se tem um profissional formado exercendo essa função como professor, que
assim se junta ao segundo motivo. Tenho vontade de desbravar esta área e buscar
novos rumos aos iluminadores para nosso estado, além de repassar os meus
conhecimentos para os que queiram adentar este mundo.
DS: Quais as dicas que você dá para quem quer
começar a atuar nesse meio?
RA: Para se
tornar um bom profissional acredito que tenha que ter três coisas fundamentais:
pontualidade, disciplina e humildade. Não nascemos aprendendo tudo, há vários
processos que podemos percorrer para se chegar onde queremos, é importante
observas os trabalhos dos outros, perguntar, ser curioso e admitir seus erros e
acerto. E falo que não se deve tentar ser o melhor, mas fazer o seu melhor.
Rodrigo, agradecemos a sua disponibilidade e o
seu interesse em participar da nossa entrevista e compartilhar o seu vasto
conhecimento, com nossos leitores e amantes das artes.
Forte abraço,
Equipe Kfeína
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Espetáculo: Balanço - Light design: Rodrigo Assis - Fotos: Layza Vasconcelos |